Café na dose certa para preservar a sua saúde
Café na dose certa
para preservar a sua saúde
A redenção dessa
preferência nacional
“O
café é a bebida que desliza para o estômago e põe tudo em movimento.” Quando
registrou esta frase, o escritor francês Honoré de Balzac (1799-1850), um
aficionado do líquido – há quem diga que entornava de 20 a 50 doses por dia -,
certamente se referia ao poder energizante do fruto do cafeeiro. Afinal, com o
auxílio dele o autor deu cabo de uma obra com mais de 10 mil páginas. O que
Balzac não podia imaginar é quão feliz foi em deixar a frase assim, tão
abrangente. Atualmente, a ciência já sabe que dar disposição é só uma das
qualidades do café.
O
curioso é que ele chegou a amargar uma posição de desprestígio, mesmo sendo
amplamente degustado. “Isso porque algumas pessoas são mais sensíveis mesmo”,
diz a nutricionista Ana Cristina Lazarotto, do Hospital Marcelino Champagnat,
em Curitiba. Mas isso não faz dele um vilão. “Existe muito mito sobre seu
consumo”, afirma o cardiologista Bruno Mioto, pesquisador do Instituto do
Coração, o InCor, na capital paulista.
Segundo
o médico, uma das explicações para esse bafafá todo tem a ver com o fato de que
os primeiros estudos foram conduzidos com seu componente mais famoso, a cafeína
– responsável pelo estado de excitação. “Só que os cientistas usavam altas
doses e de uma só vez”, explica. Daí ocorriam batedeira no peito, aumento da
pressão… “Mas a gente tem de lembrar que a bebida é tomada ao longo do dia e
não é composta somente de cafeína”, tranquiliza.
De
acordo com Silvia Oigman, neurocientista do Instituto D’Or de Pesquisa e
Ensino, no Rio de Janeiro, a cafeína representa de 1 a 2,2% do café. “Ele
possui diversas outras substâncias, com destaque para os ácidos clorogênicos,
que são antioxidantes“, informa. Nesse sentido, o conteúdo da xícara seria mais
poderoso que o vinho tinto. Certamente não é desculpa para exagerar, como
Balzac fazia. De três a cinco xícaras por dia compõem a quantidade ideal para
degustar os benefícios que verá a seguir. Sinta-se à vontade para se servir
antes de continuar a leitura.
Proteção contra
doenças da pesada
Problemas do coração
Talvez
essa seja a relação que mais colocava pulgas atrás da orelha, já que um dos
impactos do abuso da cafeína é o disparo dos batimentos cardíacos. Mas veja
bem: falamos do exagero. “Há estudos mostrando que o consumo diário e moderado
protege contra infarto, AVC e insuficiência cardíaca“, conta Mioto. E, se você
já ouviu que o grão tem substâncias que elevam o colesterol, saiba que é
verdade, sim. “No entanto, os filtros retêm até 80% delas”, garante o
cardiologista.
É
do time do expresso? Sem neura. Embora seja mais concentrado, o volume ingerido
tende a ser menor. Fora isso, Mioto conta que a discreta subida de colesterol
inclui a versão HDL da molécula, considerada protetora. Para limpar de vez a
barra do café, o médico avaliou o impacto do consumo entre pessoas com doença
coronariana – ou seja, com entupimentos nas artérias do coração – e constatou
que mesmo elas não precisam abandonar as xícaras. Recentemente, a nutricionista
Andreia Miranda, da Universidade de São Paulo (USP), analisou 550 homens e
mulheres e notou um risco cerca de 50% menor de ter pressão alta entre quem
ingeria de uma a três doses por dia. “Tudo por causa dos seus antioxidantes”,
relata.
Panes no cérebro
Aqui,
quem brilha é a própria cafeína. “Ela bloqueia dois importantes receptores de
adenosina no cérebro“, ensina o neurocientista Marcelo Cossenza, do Instituto
D’Or e da Universidade Federal Fluminense. Complicou? Saiba que essa
interrupção culmina em um efeito neuroprotetor.
Não
à toa, pesquisas já ligam o café à prevenção de doenças como Alzheimer,
Parkinson e por aí vai. O professor de farmacologia Rui Prediger, da
Universidade Federal de Santa Catarina, observou em seu laboratório que a
cafeína ajuda a evitar a morte de neurônios produtores de dopamina,
neurotransmissor envolvido no controle de movimentos, no humor e na memória.
A
perda dessas células, cabe lembrar, está na gênese do Parkinson, marcado por
rigidez e tremores involuntários. As perspectivas também animam no âmbito do
tratamento. Após dar cafeína a animais com a doença, Prediger notou que, embora
ela não reverta os danos aos neurônios, pelo menos melhora a memória e o humor.
“E isso favorece a qualidade de vida”, diz. Com base em outra linha de
pesquisa, o expert conta que a cafeína amenizaria alguns sintomas do transtorno
do déficit de atenção (TDAH). Resta comprovar tal ganho em estudos maiores.
Diabetes tipo 2
Ao
analisar mais de 120 mil pessoas, cientistas da Universidade Harvard, nos
Estados Unidos, concluíram que quem ampliou um tiquinho o consumo de café –
coisa de uma xícara – viu cair em 11% a probabilidade de encarar a condição.
Não
é o primeiro trabalho a evidenciar tal conexão. Aliás, parece que o benefício
vale até para quem curte a bebida sem cafeína. “Em estudos com ratos, os ácidos
clorogênicos e os produtos de sua degradação durante a torra do café diminuem a
concentração de glicose no sangue e levam a um aumento da sensibilidade à ação
da insulina, respectivamente”, explica a nutricionista Mônica Pinto, da
Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic).
São
mecanismos que impedem a circulação excessiva de açúcar no corpo – e a
instalação do distúrbio. Para a médica Ana Carolina Nader, da Sociedade
Brasileira de Endocrinologia e Metabologia/Regional Rio de Janeiro, não é para
ninguém passar a se entupir da bebida com o intuito de prevenir o diabetes tipo
2. “O que sabemos hoje é que indivíduos com o hábito de tomar café têm menor
risco de desenvolver a doença”, frisa. Quem já é diabético, por sua vez, não
precisa aposentar a xícara. Só dispensar o açúcar.
Problemas no fígado
O
elo entre o cafezinho e o bem-estar desse órgão está tão evidente que já há
sugestão de consumo diante de certas situações. No último grande encontro
internacional de hepatologia, ficou estabelecido que cerca de quatro xícaras
diárias são vantajosas a quem possui gordura no fígado, a esteatose. Esse é um
problema bem prevalente no Brasil, atingindo ao redor de 30% da população.
“Além
de elevar o risco de diabetes e doença cardiovascular, o quadro pode evoluir
para uma cirrose ou um tumor”, explica o hepatologista Edison Parise, da
Universidade Federal de São Paulo. O café ajudaria a barrar essa progressão.
“Mas
ainda não sabemos em detalhes como ele atua aí”, avisa o hepatologista Marcio
Dias, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Para pessoas com
hepatite C, também já se sabe que goles do líquido negro têm impacto positivo.
“Em
nossas pesquisas, quem tomava de quatro a seis xícaras apresentava uma lesão
menor no fígado”, comenta Parise. Com isso, cai a possibilidade de a hepatite
avançar para a temida cirrose – quando as lesões e cicatrizes no órgão abalam
pra valer suas funções. “Mas lembre-se: café não é remédio”, salienta o médico.
Câncer
No
ano passado, uma revisão de 105 estudos publicada na prestigiada revista
científica Nature concluiu que o hábito de tomar café está ligado a uma menor
probabilidade de um dia ter câncer de boca, faringe, fígado, cólon, próstata,
endométrio e pele. A exceção ficou por conta do tumor de pulmão – a tendência,
aí, foi de aumento de risco.
Mas
esse dado é cientificamente difícil de engolir. “Muitos estudos não deduziram o
perigo representado pelo cigarro“, examina Luis Felipe Ribeiro Pinto,
pesquisador titular e chefe do Programa de Carcinogênese Molecular do Instituto
Nacional do Câncer, o Inca.
Embora
hoje seja menos comum, ainda tem gente que adora bebericar umas xícaras junto
às tragadas. “O risco, portanto, vem do cigarro”, tranquiliza Pinto. Há pouco,
a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer fez um pente fino sobre o papel
da bebida favorita do brasileiro na prevenção de tumores. “Nos trabalhos, houve
clara redução de risco para o câncer de endométrio e fígado”, descreve o pesquisador
do Inca. E não importa se ele é coado ou expresso. Até agora, os compostos
antioxidantes lideram as apostas como grandes responsáveis pelo efeito
anticâncer.
Mais disposição e
qualidade de vida
Rendimento físico
Em
sua experiência com portadores de doenças cardíacas, o médico Bruno Mioto
percebeu que o café fazia esse pessoal render mais na esteira. Pesquisadores da
Universidade da Geórgia, nos Estados Unidos, realizaram uma revisão de nove
estudos e também viram que a ingestão de cafeína (por meio da bebida mesmo, não
de cápsulas) melhorou em 24% o desempenho dos voluntários durante a corrida ou
o ciclismo.
Não
é mera coincidência. “A cafeína nos deixa mais alertas e reduz a percepção de
cansaço durante o esforço”, explica a nutricionista Luciana Rossi, do Centro
Universitário São Camilo, na capital paulista.
Para
quem não é esportista, a especialista diz que uma dosagem bacana gira em torno
de 2 miligramas de cafeína por quilo de peso corporal. Isso significa que uma
pessoa de 50 a 65 quilos se daria bem com 100 a 150 miligramas da substância –
o que alcançamos com uma xícara de café.
A
nutricionista aconselha apreciar a bebida na hora anterior ao início do treino.
Só lembre-se de que a cafeína fica perambulando pelo corpo durante umas cinco
horas. Então, caso a sessão de ginástica aconteça à noite, quem é mais sensível
à substância pode demorar mais a pegar no sono.
Expectativa de vida
Essa
é para tranquilizar de vez os fãs do cafezinho: tomá-lo com moderação no dia a
dia garantiria aniversários extras. A nutricionista Mônica Pinto se recorda de
um estudo publicado no respeitado periódico The New England Journal of
Medicine, que levou em conta a ingestão de café por mais de 400 mil americanos
de 50 a 71 anos. “A conclusão é que o hábito de bebê-lo está inversamente
relacionado à mortalidade total”, diz. Um benefício que se estendeu inclusive à
versão sem cafeína.
Outra
vez, ponto para os polifenóis, os antioxidantes do grão, que zelam pela
integridade das nossas células. Em sua pesquisa na USP, a nutricionista Andreia
Miranda identificou a bebida quentinha como a principal fonte dessas
substâncias na dieta dos 550 voluntários. “De 70 a 80% dos polifenóis ingeridos
vieram do café. É bastante coisa”, avalia. Se você aprecia esse tesouro da
natureza, não tem por que parar de tomar. Na dose certa, ele joga no seu time –
e dá goleada.
Coado, expresso ou
instantâneo?
Existem
várias maneiras de preparar a bebida. Mas esses são os três métodos mais comuns
no Brasil. Veja abaixo suas características.
Coado
O
café coado no pano tem gosto de infância – compreensível, pois essa forma de
preparo faz parte de nossa cultura. O filtro de papel veio depois. Ambos são
eficientes em reter duas substâncias que causam uma leve subida do colesterol.
A química e analista sensorial Camila Arcanjo, do Sindicato da Indústria de
Café do Estado de São Paulo, conta que o coador de pano tem poros mais abertos
do que o de papel. “Por isso, em geral o tecido extrai um teor maior de
compostos”, revela.
Claro
que isso também depende de outros fatores, como grau de moagem do grão e tempo
de exposição à água. Agora, quem for adepto do coador de pano deve lavá-lo
sempre e deixar secar ao sol. “Se ficar úmido, pode ocorrer proliferação de
fungos“, avisa Camila.
A
versão filtrada é a mais popular no Brasil, sendo que o café puro é o campeão
de consumo. Outra receita apreciada por aqui é o pingado.
Expresso
Antes
restritas a restaurantes, as máquinas de expresso andam mais acessíveis e
viraram desejo de consumo. Pudera: em 25 segundos o café está prontinho. Ainda
que o tempo de contato do pó com a água seja menor em comparação ao filtrado, a
pressão exercida pelo equipamento permite uma bela extração dos compostos do
grão.
“Temos
a impressão de que a bebida é mais forte porque está concentrada em uma xícara
de 30 mililitros”, explica Camila. Ela relata que tudo no expresso vem em
potência extra, incluindo sabor e aroma. Para saber se foi bem tirado, é só
checar se há um creme no topo. Uma vez lá, indica-se misturá-lo à bebida para
sentir todas as suas características.
Espera-se
que até 2019 o consumo de cápsulas triplique.
Instantâneo
Sem
dúvida, é a opção mais rápida de preparo, já que basta misturar os grãozinhos à
agua quente. Mas há quem reclame do sabor, diferente em relação ao do coado e
expresso.”O café solúvel reúne teores menores de trigonelina, um componente
importante para o sabor e o aroma”, justifica Mônica Pinto, da Abic. Mas é
questão de costume. Quem dá uma chance a ele depara com algumas vantagens.
A
baixa umidade faz o produto ter vida longa, por exemplo. E como geralmente é
feito com uma espécie de café chamada robusta, costuma ostentar mais cafeína e
antioxidantes. “Se colocar leite, a mistura fica bem cremosa, porque não há
água”, recomenda a especialista.
Café
solúvel se destaca pela praticidade. Tanto é que está entre os 5 tipos
preferidos pelos brasileiros.
O coado, em vídeo
Preparo perfeito
Alguns cuidados
garantem todos os benefícios da bebida:
• Um café recém-torrado tem mais sabor.
Portanto, olho na data de validade!
• Ler a embalagem também é bacana para
saber o que esperar. Um café tradicional, daquele amargo, cai bem com leite,
por exemplo. Se quiser algo mais suave, que não demande açúcar, vá de superior
ou gourmet.
• O café moído deve ir para um pote bem
fechado e longe de umidade. Se quiser guardar na geladeira, só evite alterações
de temperatura. Para isso, volte o pó ao refrigerador logo após o uso.
• Utilize água mineral ou filtrada –
sempre fresquinha.
• A água deve ser apenas aquecida – a
temperatura indicada é de 90 °C. Se ferver, significa que há perda de oxigênio.
Daí o líquido se torna pesado e dificulta a extração dos compostos do café.
• Vai usar a garrafa térmica? O correto é
botar lá só a quantidade de caféque você pretende tomar na hora – ou, no
máximo, até 30 minutos depois.
• Nunca prepare ou guarde a bebida já
adoçada.
O
ideal é tomar puro. Se não conseguir, avalie prós e contras das opções abaixo:
• Açúcar
Há
evidências de que ele reduza a biodisponibilidade dos polifenóis do cafédentro
do corpo. O certo é que diabéticos devem evitá-lo. Duas colherinhas deixam o
café com 50 calorias.
• Adoçante
Dá
dulçor sem somar calorias. Mas a maioria dos produtos deixa um sabor residual.
Ao que tudo indica, o tipo que influencia menos no gosto é a sucralose.
• Mel
Além
de adoçar, ele conta com vitaminas, minerais e outras substâncias. Mas atenção:
reúne só um pouco menos de calorias do que o açúcar. Não é opção para
diabéticos.
O lado negro da
xícara
Tem
gente que não vê tantas maravilhas assim no café. É que o exagero ou a
sensibilidade a seus ingredientes podem gerar alguns reveses
Gravidez
A
cafeína interfere no aproveitamento de uma substância chamada adenosina,
importante para a formação do feto. Daí o conselho de dar uma boa maneirada
nessa fase. Se consumir, misture ao leite.
Gastrite
Tudo
indica que a bebida não dá origem ao problema. “Mas a cafeína estimula a
secreção gástrica, causando desconforto no estômago”, diz a nutricionista Ana
Lazarotto. Nada de abusar, hein?!
Insônia
Há
pessoas que não toleram tão bem a cafeína, o que atrapalha o sono. Mas não
precisa excluir o café. Só ajustar dose e horário de consumo. Não passe de três
xícaras e beba até às 17 horas.
Ansiedade
A
bebida em si não causa o transtorno. Porém, a cafeína é capaz de, em pessoas
propensas, despertar sintomas de ansiedade. “Aí é melhor restringir o consumo”,
aconselha Marcelo Cossenza.
Arritmia
Embora
se fale muito em palpitação, o médico Bruno Mioto conta que estudos já
indicaram menos internação por arritmia entre fãs de café. “Mas isso é bem
individual”, lembra. Se o peito dispara, melhor evitar.
Abstinência
Pode
acontecer – e provocar dor de cabeça e mau humor. “O cérebro se adapta à
ingestão regular”, relata Cossenza. Quando a cafeína entra no corpo, o cérebro
sente a maior recompensa.
Fonte de Pesquisa:
http://saude.abril.com.br/especiais/cafe-na-dose-certa/
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